A falta grave do empregador e a justa causa patronal

Existem determinadas situações em que a responsabilidade pelo fim do contrato de trabalho é imputada ao empregador. Nesses casos, o empregado tem resguardado os seus direitos trabalhistas, devendo, para tanto, pleitear judicialmente a rescisão indireta do seu contrato laboral.

A Consolidação das Leis do Trabalho dispõe em seu artigo 473 acerca das hipóteses em que o trabalhador poderá considerar rescindida a sua contratação, desde que tal rescisão seja reconhecida em juízo.

Mas o que seria a rescisão indireta?

Segundo o procurador do trabalho Henrique Correa:

"Em razão da conduta do empregador, é permitido ao trabalhador colocar fim ao contrato de trabalho, como se houvesse dispensa sem justa causa. A rescisão indireta é chamada, também, de justa causa patronal.

(...).


Em regra, a rescisão indireta será declarada pela Justiça do Trabalho, pois em raríssimas hipóteses o empregador irá confessar a conduta lesiva ao trabalhador. Em resumo, uma vez praticada a falta grave, o empregado deixa de trabalhar, comunica à empresa a sua decisão e ajuíza a ação trabalhista requerendo o reconhecimento da justa causa do empregador (art. 483 da CLT)".

De mais a mais, a Lei Complementar nº 150, de 1º de junho de 2015, que sistematiza o contrato de trabalho no âmbito doméstico, em seu artigo 27, parágrafo único, inciso VII, trouxe mais uma hipótese de rompimento do contrato por culpa do empregador.

Dito isso, recentemente o Tribunal Regional do Trabalho da 2ª Região manteve a rescisão indireta em favor de uma trabalhadora que era censurada de ir ao banheiro. Em seu voto, a relatora ponderou que "na hipótese dos autos, restou comprovado, pelo depoimento testemunhal colhido, que a reclamante era submetida a situação constrangedora por parte de seus supervisores, os quais, no exercício de seu trabalho, extrapolavam o poder de direção inerente ao empregador".

Noutro giro, a 14ª Turma do mesmo Tribunal Regional reconheceu a rescisão indireta em um caso envolvendo o pagamento de salário inferior ao previsto em acordo coletivo, por entender que este fato constituiu em falta grave, e, assim sendo, passível de extinguir o contrato.

Entrementes, segundo o Tribunal Superior do Trabalho, um dos assuntos mais recorrentes nas Varas até março de 2022 diz respeito à rescisão indireta, ocupando o 14º lugar no ranking com 51.915 processos sobre essa temática.

Aliás, uma pesquisa concluiu que o estado de São Paulo registrou um aumento de 11% nos pedidos judiciais de rescisão indireta no ano de 2021, em virtude da negligência e falta de cuidados na prevenção no combate à Covid-19 pelos empregadores durante a pandemia.

Lado outro, a Instrução Normativa nº 2, de 8 de novembro de 2021, que dispõe sobre os procedimentos a serem observados pelos órgãos de fiscalização do Trabalho, prevê que em situações de irregularidades e, não sendo essas sanadas conforme determinação do auditor-fiscal, restará configurada a rescisão indireta do contrato de trabalho.

De mais a mais, algumas situações como atraso de salários, não recolhimento do FGTS, constrangimentos e assédio (moral e sexual), descumprimento de obrigações contratuais, não pagamento de horas extras, dentre outras, poderão ensejar a ruptura contratual nesta modalidade.

Se é verdade que o empregador pode dispensar o trabalhador em determinadas situações por justo motivo, de igual modo, uma vez caracterizado atos faltosos da empresa e que impossibilite a continuidade da relação de emprego, o empregado poderá aplicar a justa causa patronal, devendo essa ser reconhecida judicialmente em processo trabalhista a ser movido pelo funcionário em face do seu empregador.

Frise-se, por oportuno, que a justa causa é a maior e mais grave penalidade aplicada, tanto ao empregado quanto ao empregador, e, por esta razão, é imprescindível que o ato faltoso cometido seja grave o suficiente a impedir a continuidade do contrato.

Outrossim, deve-se sempre observar a proporcionalidade do ato faltoso em cotejo com as hipóteses de despedimento indireto, a fim de evitar que minúsculos desacertos acarretem o rompimento do contrato.

Além disso, uma questão polêmica envolvendo a rescisão indireta do contrato diz respeito à imediatidade do empregado em ajuizar a ação para ter o seu direito reconhecido. O Tribunal Superior do Trabalho já foi provocado a emitir juízo de valor sobre esse assunto e, na ocasião, entendeu que a demora em ajuizar a ação não afasta o direito à rescisão indireta.

Em seu voto, o ministro relator esclareceu que a empregada, "na condição de hipossuficiente na relação de emprego, abstém-se de certos direitos, dentre os quais o ajuizamento de reclamações trabalhistas, com o receio de não ser contratada ou perder o emprego". Com esse fundamento, concluiu que a rescisão indireta não necessita ser imediata, e tampouco acarretaria perdão tácito, no caso de retardamento no ajuizamento da demanda.

Portanto, uma vez reconhecida em juízo a rescisão indireta do contrato de trabalho, o empregado terá direito a integralidade de suas verbas rescisórias, como se tivesse sido despedido sem justa causa.

De outro lado, o artigo 484 da Consolidação das Leis do Trabalho e a Súmula 14 do Tribunal Superior do Trabalho dispõem sobre a hipótese de culpa recíproca, ou seja, quando as faltas são praticadas simultaneamente entre empregado e empregador. Nesse cenário, as verbas rescisórias são pagas pela metade ao trabalhador, e não haverá direito ao seguro-desemprego.

Em arremate, para que sejam evitadas ações trabalhistas nesse sentido, é preciso que os empregadores além de cumprirem com as obrigações decorrentes do contrato de trabalho, garantam aos seus trabalhadores um meio ambiente do trabalho seguro e saudável.



Artigo 483 — O empregado poderá considerar rescindido o contrato e pleitear a devida indenização quando: a) forem exigidos serviços superiores às suas forças, defesos por lei, contrários aos bons costumes, ou alheios ao contrato; b) for tratado pelo empregador ou por seus superiores hierárquicos com rigor excessivo; c) correr perigo manifesto de mal considerável; d) não cumprir o empregador as obrigações do contrato; e) praticar o empregador ou seus prepostos, contra ele ou pessoas de sua família, ato lesivo da honra e boa fama; f) o empregador ou seus prepostos ofenderem-no fisicamente, salvo em caso de legítima defesa, própria ou de outrem; g) o empregador reduzir o seu trabalho, sendo este por peça ou tarefa, de forma a afetar sensivelmente a importância dos salários.

Fonte: Conjur

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