Ausência de perícia ampara decisão dos jurados no caso Carandiru, diz STJ
A impossibilidade de realizar perícia para saber qual policial militar atirou em qual preso na Casa de Detenção do Carandiru, no massacre de 111 pessoas durante rebelião, é suficiente para amparar o julgamento da ação penal com base em outras provas nos autos.
Essa foi a conclusão da 5ª Turma do Superior Tribunal de Justiça, que na terça-feira (10/8) manteve a condenação dos PMs em cinco Tribunais do Júri, pela morte de 111 detentos em São Paulo, em 1992. O acórdão foi publicado nesta segunda-feira (16/8).
Por unanimidade de votos e sem debate na sessão, o colegiado manteve a decisão monocrática do ministro Joel Ilan Paciornik, que em junho de 2021 derrubou o acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo que havia absolvido os PMs.
No agravo, o relator repisou os fundamentos da monocrática e foi acompanhado por unanimidade. Entendeu que não há prova cabal de que os jurados que julgaram e condenaram 74 policiais decidiram de maneira manifestamente contrária à prova dos autos.
Um dos pontos mais relevantes do julgamento do caso foram os problemas periciais. Em 2016, o TJ-SP apontou que não houve análise balística para determinar a origem dos tiros que mataram os presos.
Segundo a Defensoria Pública de SP, seriam necessários quase 91 mil confrontos balísticos — além de as armas dos policiais só terem sido entregues à perícia vários dias depois do massacre e de o local não ter sido preservado para análise pericial.
Na ocasião, os projéteis retirados dos corpos das vítimas ficaram guardados, uma vez que o Instituto Médico-Legal alegou que não tinha meios para fazer aquele número de análises. Posteriormente, sumiram de dentro do Fórum, segundo a defesa dos PMs.
A argumentação que somou para a absolvição deles pelo TJ-SP foi de que a impossibilidade de saber quais foram os crimes cometidos por cada um dos agentes não poderia agir contra os réus. Por isso, incabível a condenação.
Para a 5ª Turma do STJ, além do desaparecimento dos vestígios, a impossibilidade de realização da perícia também ampara o transcurso e julgamento da ação penal com base em outras provas nos autos.
Isso porque os jurados concluíram por acatar a tese acusatória com base em outros elementos: laudos de necropsia, depoimento das vítimas sobreviventes, depoimento de perito, depoimento de diretor de disciplina da casa de detenção e sindicância realizada por três juízes corregedores.
Essa previsão consta no artigo 167 do Código de Processo Penal: "não sendo possível o exame de corpo de delito, por haverem desaparecido os vestígios, a prova testemunhal poderá suprir-lhe a falta".
Ao julgar a apelação, o TJ-SP afastou a aplicação dessa norma porque não houve ausência de vestígios: "362 armas utilizadas pelos policiais foram apreendidas mais de 450 projéteis foram extraídos dos corpos das vítimas e, assim, a necessária perícia não foi realizada".
Com base nas demais provas apresentadas e no debates durante o julgamento, os jurados responderam afirmativamente ao quesito da autoria que contemplava indagação sobre a unidade de desígnios.
"Estando a imputação delitiva amparada em concurso de agentes (liame subjetivo), embora o confronto balístico pudesse melhor esclarecer os fatos a respeito da autoria dos disparos que acertaram as vítimas, tal elemento de prova, por si só, não afastaria a autoria dos demais policiais que concorreram de outra forma para o delito", afirmou o ministro Joel Ilan Paciornik.
"Reafirma-se, mesmo que produzido o confronto balístico, competiria aos jurados, assim como a eles competiu, a análise das provas para decidir sobre a responsabilidade de cada policial", concluiu.
Fonte: ConJur