Câmara deve votar PEC que altera regras de composição do CNMP
O presidente da Câmara dos Deputados, Arthur Lira, quer votar nesta terça-feira (19/10) a a Proposta de Emenda à Constituição 5/21, que muda a composição do Conselho Nacional do Ministério Público (CNMP). A sessão do Plenário está marcada para as 15h.
Segundo o texto, o CNMP terá 17 integrantes (ante os atuais 14), sendo cinco indicados ou eleitos pelo Poder Legislativo (hoje são 2), mas todos ainda oriundos do próprio MP. O mandato dos integrantes continuará a ser de dois anos, permitida uma recondução, e cada indicado precisará passar por sabatina no Senado.
Entre outros pontos, o texto do relator, deputado Paulo Magalhães (PSD-BA), também exige que o Ministério Público crie, em 120 dias, um código de ética que vise combater abusos e desvios de seus integrantes. Se esse prazo não for cumprido, caberá ao Congresso elaborar o código por meio de uma lei ordinária. A proposta também trata da escolha do corregedor nacional do Ministério Público, que será o vice-presidente do CNMP.
Em entrevista à revista
Veja, Arthur Lira afirmou que todos os seis pedidos de representantes do Ministério Público foram atendidos em acordo para que a proposta seja votada nesta terça. "O Congresso se abriu, coisa que o Ministério Público não faria. Agora, tem temas que são inegociáveis. Que têm de ir a voto democraticamente, sem versão."
Entre as divergências está a necessidade de a indicação do corregedor do Ministério Público ser votada pelo Congresso Nacional. "Precisa ter um corregedor do Ministério Público que se passe em uma votação do Congresso Nacional, como passam os ministros do Supremo, do STJ, o procurador-geral da República, embaixadores. É normal", comparou Lira.
"Qual o problema? É desmerecimento um membro do Ministério Público ser votado pelo Congresso Nacional? Não é uma supremacia muito ampla, uma narrativa muito desfocada? Esse debate nós faremos no Plenário da Câmara com absoluta transparência e normalidade", afirmou.
Pouca puniçãoA demissão do procurador Diogo Castor na véspera da votação da Câmara não muda o fato de que o CNMP é um dos órgãos menos rigorosos com os desvios internos. O conselho aplica três vezes menos punições aos seus servidores (que são quase 13 mil) do que a Polícia Federal, por exemplo, que tem cerca de mil integrantes a menos.
Desde 2005, apenas 20 promotores e procuradores foram demitidos. O número representa exatamente a média anual de demissões da PF. Somente entre 2010 e 2017, a Polícia Federal demitiu 162 servidores.
A atuação disciplinar do CNMP fica clara no caso do procurador Deltan Dallagnol, coordenador da finada autoapelidada "lava jato". Deltan é parte em 52 processos. Em termos de disciplinares, são 49: três PADs, uma sindicância e 45 reclamações. Mesmo assim, só recebeu duas penalidades: uma censura e uma advertência, sendo que esta última está suspensa pelo Supremo Tribunal Federal.
No caso do já icônico
PowerPoint que colocava o ex-presidente Lula no centro de uma organização criminosa, Deltan foi beneficiado por prescrição em processo administrativo adiado nada menos que 42 vezes antes de ser julgado.
Transparência zeroEm 2011, logo após a implantação a Lei de Acesso à Informação, o então presidente da ONG Transparência Brasil, Cláudio Abramo, afirmou que o Ministério Público era a instituição menos transparente do Brasil.
Para fundamentar sua constatação, ele citou o relatório de atividades do Conselho Nacional do Ministério Público: "Das doze páginas do relatório, dez são dedicadas a explicações sobre os motivos de os MPs estaduais não terem fornecido os dados pedidos, as outras duas páginas falam da falta de dados do MP federal. Nem o Ministério Público Federal nem os estaduais dão qualquer informação", disse Abramo, matemático.
"Eles não obedecem qualquer hierarquia e sonegam qualquer dado sobre seu desempenho", afirmou. Para ele, cabe à imprensa "acompanhar o que faz esse MP mal vigiado e mal controlado".
Autonomia e neutralidadeEm entrevista à
ConJur, o cientista político e pesquisador do MP Fábio Kerche ressaltou que o nível de autonomia e independência do órgão persecutório brasileiro é bastante incomum para uma democracia, que pressupõe que a liberdade institucional seja balanceada pelo dever de prestar contas à sociedade.
Ele lembrou que o MP tem um histórico de resistência muito grande a qualquer abertura que os obrigue a prestar contas. "Na década de 1990 ainda, a chamada "PEC da mordaça" queria regulamentar que promotores não saíssem a público antes de uma ação ser julgada, condenando publicamente as pessoas. Foi uma chiadeira total, tanto que ganhou esse apelido. E a imprensa comprou muito o lado do MP."
Ele explica que, nas democracias com conselhos ligados ao MP, eles funcionam basicamente conforme dois modelos: quando a procuradoria é pouco independente, o conselho atua para aumentar essa independência; quando é muito, o conselho reforça algum tipo de controle da sociedade sobre o órgão. Mas no Brasil, ele aponta, um órgão que já é bastante autônomo tem um conselho que potencializa essa autonomia. "Essa combinação de autonomia com discricionariedade é muito incomum nas democracias", afirma.
"Mesmo assumindo que não há um modelo ideal, o maior equilíbrio entre os representantes externos e internos — e eu diria mais, até uma leve composição com uma maioria de atores externos ao Ministério Público — seria positivo. Para o próprio órgão, porque mostraria um compromisso com a democracia, do tipo 'não temos medo das nossas escolhas'. Acho que respeitaria um pouco mais esse pressuposto da democracia", defende o cientista político.
Com informações da Agência Câmara de Notícias.Fonte: Conjur