Consequências nefastas da gravação das audiências trabalhistas

Foi aprovada pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho, por maioria de votos, a Resolução CSJT nº 313, de 22 de outubro de 2021, que dispõe sobre os procedimentos a serem observados na videogravação de audiências realizadas na esfera da Justiça do Trabalho. Segundo a citada Resolução, não há obrigatoriedade de transcrição ou degravação dos depoimentos obtidos em audiências ocorridas com gravação audiovisual.

Corregedorias dos Tribunais e do CNJ, mas não aos acórdãos proferidos.

Dito isso, conquanto o avanço tecnológico seja inevitável, este deve se adequar o processo e não o contrário, de forma que o processo do trabalho seria beneficiado se houvesse utilização dos dois procedimentos, ou seja, a transcrição ou degravação dos depoimentos de partes e testemunhas, aliada à gravação da audiência.

Até porque, em âmbito recursal, é sabido que os Tribunais Regionais do Trabalho lidam com as provas que foram colhidas pelo Primeiro Grau de Jurisdição, possuindo a grande responsabilidade de dizer a “última palavra” acerca do painel probatório no tocante à (in)existência dos fatos que estarão descritos no acórdão a ser proferido pelo Colegiado.

E com a atual e nova orientação do CSJT que faculta a transcrição ou a degravação dos depoimentos, na prática se tornou um verdadeiro contrassenso obrigar que todos os integrantes do Colegiado tenham que assistir aos vídeos para, em cada matéria fática trazida nos tópicos recursais que lhe são direcionados, emitam juízo de valor se a decisão de Origem foi acertada ou não naquele ponto controvertido.

Todo esse “trabalho”, que inicialmente já era feito pelo Primeiro Grau, doravante passa a ser refeito, uma vez mais, pela Turma/Câmara julgadora, composta por 3 (três) Desembargadores, se traduzindo numa prática absolutamente contrária à razoável duração do processo, tida como garantia constitucional preconizada no inciso LXXVIII do artigo 5º da Carta da República.

Essa exigência, por certo, na opinião da advocacia trabalhista ora citada pelas entidades de classe, não apresenta nenhuma utilidade prática e atenta contra os princípios da justiça, da efetividade processual, da celeridade e da razoável duração do processo. Ademais, essa diretriz movimenta a máquina judiciária de modo a consumir tempo e recursos de forma completamente inútil.

E não bastasse o retardamento à boa marcha processual dos apelos nos âmbitos dos Tribunais Regionais, ainda há que se frisar, sobretudo, que para fins de interposição de recurso de revista para o Tribunal Superior do Trabalho não é possível o chamado “reexame de fatos e provas”, por se referir a impedimento contido na Súmula de nº 126, afinal, em âmbito extraordinário do TST não mais se discute a denominada “justiça da decisão”, e sim se ela está em conformidade com a legislação trabalhista infraconstitucional e aos regramentos da Constituição Federal.

Aqui reside, talvez, o principal efeito nefasto da aludida Resolução do CSJT, uma vez que se o acórdão efetivamente não trouxer ao longo de sua fundamentação todos os elementos de prova produzidos em audiência, até para permitir que a Corte de Vértice Trabalhista exerça o controle da legalidade da decisão por meio do “reenquadramento jurídico” dos fatos e das provas, na prática tais questões não mais se submeterão a um novo julgamento pelo TST, tornando os julgamentos ainda mais regionais sob a ótica do entendimento de cada órgão turmário, deixando de existir uma efetiva uniformização de posicionamento jurisprudencial sobre aquele ponto objeto de recurso.

E para melhor explicitar tal relevante diferença entre o “reexame de fatos e provas”, vedado como dito pela Súmula nº 126 do TST, em comparação com o “reenquadramento jurídico” do conjunto probatório contido no acórdão, oportunos os ensinamentos da Ministra do TST, Kátia Magalhães Arruda, a saber:

“A Corte Regional é soberana na apreciação do conteúdo da prova e na respectiva valoração, assim como tem a última palavra quando se trata de afirmar ou negar a existência de um fato controvertido. [...]. Em suma, a sistemática é a seguinte: se o TRT diz que houve  a prova do fato, não pode o TST afirmar que a prova não teria sido produzida -  isso é discussão vedada pela Súmula n. 126 do TST; diferentemente, se a Corte regional decide que houve a prova do fato, e, daí, interpretando a norma em debate, reconhece o efeito jurídico ‘A’, pode o TST concluir, levando em conta as premissas fático-jurídicos constantes na decisão recorrida, que a interpretação da norma em debate leva ao reconhecimento do efeito jurídico ‘B’ [...]”.

Neste cenário que, doravante, se apresenta com a facultatividade da transcrição ou degravação dos depoimentos de partes e testemunhas, aliado ao fato de que o Supremo Tribunal Federal, na ADI 5.766, julgou pela inconstitucionalidade do §4º do artigo 791-A da CLT que condenava o beneficiário da justiça gratuita ao pagamento de honorários advocatícios sucumbenciais devidos aos advogados da parte contrária, já é esperado que para o ano de 2022 haja um aumento exponencial não só o número de novas reclamatórias, como também quanto à própria somatória de pedidos, tornando a Justiça do Trabalho morosa com o passar do tempo, ela que sempre foi tida como um ramo célere e bastante efetivo do Poder Judiciário.

Em arremate, se é verdade que, desde 2017, com a vigência da Lei da Reforma Trabalhista, muitas questões problemáticas ainda não foram pacificadas pela Corte Superior Trabalhista, impondo a obrigação de recursos pelas partes até Brasília; e, ainda, com o grande acesso ao Poder Judiciário Laboral, representado não apenas pela concessão da gratuidade judiciária, como também pela isenção/redução/substituição do depósito recursal pelo seguro garantia judicial pelos empregadores com a edição da Lei nº 13.467, fica cada vez mais claro que o ato de recorrer, conquanto seja reputado como o exercício do direito constitucional de prolongamento do direito de ação, está a cada dia mais a sobrecarregar este sistema de justiça especializado que possui capacidade finita de orçamento e, em especial, de magistrados e servidores responsáveis por seu cumprimento.

Fonte: Conjur

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