Desvio de mensagens de investigados para telefone da polícia é ilegal, decide o STJ
A substituição do chip do telefone de investigado por um da polícia, sem o seu conhecimento, é ilegal porque torna o investigador um participante das conversas, podendo interagir com o interlocutor e gerenciar todas as mensagens, possibilidade de investigação que não tem previsão na Constituição, nem na Lei 9.296/1996.
Esse entendimento foi fixado pela 6ª Turma do Superior Tribunal de Justiça ao manter um acórdão do Tribunal de Justiça de São Paulo (TJ-SP) que invalidou uma determinação judicial para que uma operadora redirecionasse temporariamente para telefones da polícia as chamadas e mensagens dirigidas aos chips dos celulares dos investigados.
De acordo com a corte estadual, essa transferência — autorizada em liminar, a pedido da polícia — não tem respaldo no artigo 5º, inciso XII, da Constituição, tampouco na Lei 9.296/1996, que regula a interceptação de telecomunicações em investigações criminais. Para o tribunal paulista, além de constituir uma forma ilícita de interceptação, esse procedimento causa a suspensão indevida da comunicação telefônica e telemática dos investigados.
No recurso apresentado ao STJ, o Ministério Público Federal sustentou que esse tipo de interceptação não é ilegal e alegou que a medida judicial permitiria aos investigadores obter, em tempo real, os dados enviados aos telefones dos investigados, como as chamadas recebidas e as mensagens envidas por meio de aplicativos como WhatsApp e Telegram.
A ministra Laurita Vaz, relatora do recurso, constatou que a substituição dos chips dos investigados por terminais da polícia realmente permitiria aos investigadores o acesso irrestrito a todo o conteúdo das comunicações, inclusive com a possibilidade de envio de novas mensagens pelo WhatsApp e exclusão de outras, mas ressaltou que não há previsão legal para isso.
"Se não bastasse, eventual exclusão de mensagem enviada ou de mensagem recebida não deixaria absolutamente nenhum vestígio e, por conseguinte, não poderia jamais ser recuperada para servir de prova em processo penal, tendo em vista que, em razão da própria característica do serviço, feito por meio de encriptação ponta a ponta, a operadora não armazena em nenhum servidor o conteúdo das conversas dos usuários", afirmou a magistrada.
Ela destacou também que a hipótese dos autos é diferente de precedente do STJ no qual se reconheceu a legalidade da obtenção de conversas já registradas em aplicativo de mensagens instantâneas, situação semelhante ao acesso autorizado a conversas realizadas por e-mail, que é permitido por lei.
Conforme lembrou a ministra, exatamente por falta de previsão legal a 6ª Turma reconheceu em outro precedente a ilegalidade do espelhamento feito pela polícia de conversas trocadas por investigados por meio do WhatsApp.
Ao negar o recurso do Ministério Público, a relatora considerou correto o entendimento do TJ-SP no sentido de que, por ser uma exceção à garantia constitucional da inviolabilidade das comunicações, a interceptação telefônica e telemática só pode ser autorizada nos estritos limites da lei, não se admitindo a ampliação das hipóteses previstas ou a criação de procedimento investigatório diferente.
Com informações da assessoria de imprensa do STJ.Fonte: ConJur