Indefinição legislativa torna impugnação de candidaturas um tormento para o TSE

A Justiça Eleitoral segue com um problema inatacável: a impossibilidade de julgar todas as impugnações a registro de candidatura antes do término do período eleitoral. As soluções estão fora do alcance da corte: dependem de definições legislativas que, para as Eleições de 2022, já não serão possíveis.

O problema é de prazo. O artigo 11 da Lei das Eleições (Lei 9.504/1997) determina que partidos e coligações solicitem o registro de seus candidatos até as 19h de 15 de agosto do ano em que se realiza o pleito. A votação, por determinação constitucional, ocorre sempre no primeiro final de semana de outubro.

A impugnação ao registro de candidatura, por sua vez, deve ser feita no prazo de cinco dias após a publicação do pedido, conforme o artigo 66, parágrafo 3º da mesma lei.

Esse cenário confere cerca de 45 dias para que as impugnações e seus recursos galguem todos os degraus pelas instâncias ordinárias até chegar ao Superior Tribunal Eleitoral, que fatalmente dará a palavra final sobre o caso concreto.

É um prazo insuficiente, ainda que a Justiça Eleitoral seja, de longe, a mais célere do Brasil. Dados do levantamento Justiça em Números 2021 (com dados de 2020), do Conselho Nacional de Justiça, mostram que, no primeiro grau, o prazo médio para sentença é de três meses.

A consequência é que muitos candidatos concorrem sub judice e têm sua situação analisada depois de eleitos. Se cassados, podem gerar eleições complementares e mais gastos. Por isso, o presidente do TSE, ministro Luís Roberto Barroso definiu a necessidade de cassar alguém que foi escolhido pela vontade popular como "um tormento".

"É o pior papel que temos que desempenhar. Mas é nosso papel, em cumprimento da Constituição e da legislação", acrescentou, em evento na tarde de segunda-feira (25/11), quando o tribunal lançou o banco unificado de inelegibilidades, que vai facilitar o trabalho da Justiça eleitoral.

O número de candidatos vem, também, crescendo. Em 2014, 26,1 mil pessoas requereram registro de candidaturas aos cargos de presidente, vice-presidente, governador, vice-governador, senador, deputado federal, deputado estadual e deputado distrital, dos quais 21,9 mil encontraram-se aptos. Quatro anos depois, esse número aumentou 11,1%, para 29 mil, com 26 mil aptos.

Barroso vê duas saídas e diz que tem insistido junto ao Congresso Nacional para que analise alguma delas.

Antecipar o registro

A primeira delas é a ampliação do prazo entre o registro das candidaturas e as eleições. Essa hipótese estava contemplada no Projeto de Lei Complementar 121/2021, chamado de Novo Código Eleitoral, que tramitou às pressas no Congresso, mas não foi aprovado até 2 de outubro — um ano antes das eleições de 2022 e, portanto, data limite para alterar regras em relação ao pleito seguinte.

O projeto, que foi apresentado por um grupo de deputados, passou na Câmara e aguarda votação no Senado, prevê, no artigo 201, que o pedido de registro de candidatura seja apreciado até as 19h de 1º de junho, o que significaria prazo de 120 até a data as eleições.

Há outras propostas ainda mais generosas. O Projeto de Lei 5.320/2020, do deputado Alexandre Frota (PSDB-SP), adianta para 15 de maio o registro, o que totalizaria 140 dias até a eleição. A justificativa é a sociedade brasileira não suportar mais conviver com a indefinição da legalidade da inscrição de determinado candidato aos cargos eletivos.

"O que se pretende é que o Judiciário dê uma resposta em tempo hábil sobre a homologação ou não de determinada candidatura, não podemos mais permitir a dúvida sobre a possibilidade ou não do cidadão votar em seu candidato de preferência e ao final saber que a candidatura não foi homologada pelo Tribunal Eleitoral", diz o projeto, tramita apensado.

Antes, em 2018, o deputado Marcos Rogério (DEM-RO) propôs no Projeto de Lei 10.871/2018 que o registro seja feito de 20 de junho a 5 de julho (90 dias até a eleição), citando na justificativa que, considerando todos os prazos processuais, "a conta não fecha" para que sejam julgados até a eleição, em prejuízo à segurança jurídica. O PL tramita apensado. O prazo é o mesmo sugerido pelo PL 1.032/2019, do deputado federal Gustavo Fruet (PDT-PR), que também tramita apensado.

Pré-registro de candidatura

A outra possibilidade, segundo o ministro Barroso, é estabelecer um sistema de pré-registro de candidatura feito no início do ano eleitoral. Isso permitiria aos candidatos terem toda a documentação preparada com antecedência. Uma vez aprovada a pré-candidatura, já seria possível inclusive oferecer impugnação.

A proposta que melhor ecoa esse conceito é o Projeto de Lei 4.893/2019. A ideia é que aqueles que pretendam concorrer requeiram ao juiz eleitoral de seu domicílio o exame de sua situação eleitoral para fins de habilitação prévia de sua candidatura entre 1º de fevereiro e 31 de março (185 dias antes da eleição).

Nesse momento, a Justiça Eleitoral vai conferir se o cidadão goza de seus direitos políticos, se votou regularmente nas eleições, se atendeu a convocações da Justiça Eleitoral, se tem multas eleitorais a pagar e se deixou de apresentar contas em campanhas passadas.

O pedido de habilitação prévia será publicado por edital, inclusive na internet, e poderá ser contestado pelos partidos políticos ou pelo Ministério Público. A decisão declaratória da Justiça Eleitoral deverá ser proferida até 15 de maio (140 dias antes da eleição).

Essa proposta, no entanto, já foi rejeitada pelo Congresso. O projeto foi apresentado pelo deputado Luiz Philippe de Orleans e Bragança (PSL-SP), mas a ideia constava no PL 8.612/2017, de autoria da Comissão Especial para a Reforma Política. Em outubro daquele ano, a Lei 13.488/2017 foi aprovada como minirreforma eleitoral sem esse trecho. Atualmente, o PL aguarda designação de relator.

Na mesma linha, o PL 5.025/2020 propõe que o postulante a candidatura majoritária deverá requisitar à Justiça Eleitoral a declaração provisória de regularidade de candidatura em até 90 dias antes das convenções partidárias, que atualmente ocorrem de 20 de julho a 5 de agosto. Ou seja, até 21 de abril (160 dias antes da eleição).

Essa declaração será requisito obrigatório para que um pré-candidato possa ser escolhido nas convenções. Autor do projeto, o deputado Felício Laterça (PSL-RJ) cita a existência de candidaturas e campanhas artificiais que manobram nas lacunas da legislação eleitoral com objetivo de macular a legitimidade e autenticidade do processo de eleição brasileiro.

O objetivo é antecipar, ainda que em caráter provisório, a manifestação da Justiça Eleitoral quanto aos requisitos de elegibilidade. "Com isso, as candidaturas aprovadas em convenção partidária já nasceriam com a presunção de veracidade e de boa-fé necessária para a manutenção da normalidade e da legitimidade do processo eleitoral", diz, na justificativa do PL, que tramita apensado.

Como só vale para cargos majoritários, a declaração provisória de regularidade do presidente e vice-presidente seria conferida pelo TSE; a do governador e vice, pelos Tribunais Regionais Eleitorais; e a de prefeitos e vice, na zona eleitoral correspondente.

O momento de julgar

O drama vivido pela Justiça Eleitoral quanto aos pedidos de registro de candidaturas passa pelo momento correto de julga-las, tema que também está em discussão no Congresso. O PL 5.639/2020 cita o colossal volume de pedidos como um "impeditivo incontornável" à Justiça especializada. Assim, propõe que, nos 20 dias que antecedem a eleição, sejam suspensos os julgamentos de recursos eleitorais interpostos em face de sentença que julgar improcedente a impugnação de registro de candidatura deferido.

"Entendemos ser inaceitável que a atuação do Estado às vésperas de eleição comprometa, ainda que involuntariamente, a neutralidade da competição eleitoral e desequilibre a reta final da disputa eleitoral, motivo pelo qual contamos com o apoio dos nobres pares para a aprovação desta proposição", justifica o deputado Gilberto Abramo (Republicanos-MG), autor do PL, que aguarda designação de relator na Comissão de Constituição e Justiça e Cidadania (CCJC).

O Congresso também discute o que fazer com os votos dados a candidaturas que forem impugnadas e derrubadas pela Justiça eleitoral após o pleito. Os parágrafos 3º e 4º do artigo 175 do Código Eleitoral determinam que, nessa hipótese, os votos poderão ser computados para o partido no caso de eleições proporcionais (deputado e vereador).

Como mostrou a ConJur, essa mesma previsão constava da Resolução 23.554/2017 do TSE, que orientou o proceder para a eleição de 2018. Em outubro de 2020, a corte decidiu passar por cima dessa regra para anular os votos de um candidato que teve o registro cassado.

O PL 2.766/2019 propõe a mesma solução, pela alteração do artigo 175 do Código Eleitoral, baseado justamente no fato de a formalização dos registros de candidatura se superpor ao início do período eleitoral. Segundo o deputado Cláudio Cajado (PP-BA), isso impede que conheçamos, de antemão, quem pode ou não disputar o pleito.

"Acontece que não parece razoável essa transferência de votos à legenda de um candidato que disputou as eleições e teve o seu registro indeferido enquanto considerado inelegível", cita, na justificativa para o PL, que aguarda designação de relator.

Fonte: Conjur

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