Pesquisas apontam desafios para enfrentar candidaturas fictícias de mulheres
Candidaturas esvaziadas financeiramente, candidatas que não são chamadas para debates ou reuniões e que são alijadas de qualquer informação relativas aos partidos fazem parte de uma realidade brasileira que só reforça o distanciamento das mulheres da representatividade política.
O Seminário de Pesquisas Empíricas Aplicadas a Políticas Judiciárias do Conselho Nacional de Justiça (CNJ) apresentou duas pesquisas que revelam alguns dos desafios da justiça eleitoral em relação às candidaturas de mulheres brasileiras a cargos representativos e mostram que mulheres que pleiteiam um espaço político no país precisam lidar com a violência política de gênero.
"Os partidos dizem que elas não se interessam, mas esse debate é muito complexo. Temos uma pesquisa que mostra que nenhum partido cumpre os 5% que deve aplicar no fortalecimento de candidaturas de mulheres. É fruto da sociedade patriarcal essa resistência. O incentivo dos partidos é muito pequeno. Há uma resistência interna", disse Roberta Laena Costa Jucá, que apresentou a pesquisa "O não lugar da política: as candidaturas fictícias de mulheres na disputa eleitoral". O estudo — que virou livro em 2020 — foi baseado em entrevistas com mulheres candidatas fictícias nas eleições municipais de 2018 no Ceará.
Para Roberta Jucá, o machismo e a resistência dos homens às candidaturas femininas desencorajam a participação delas na vida política do país. "Não é que não há mulheres interessadas. Os partidos fazem pouco para incluí-as", afirma a especialista. Roberta explicou que a política de cotas, criada como forma de corrigir a sub-representatividade de gênero e aumentar a quantidade de mulheres candidatas, tem sido fraudada por meio das candidaturas fictícias.
A fraude acontece de várias maneiras e tem como objetivo legitimar o partido em relação à política de cotas exigida pela legislação eleitoral e partidária, que estimula a participação feminina na política. A norma estabelece um percentual mínimo de 30% de candidaturas de cada sexo (Lei 9.504/1997) e impõe a aplicação de, no mínimo, 5% dos recursos do Fundo Partidário na criação e manutenção de programas de promoção e difusão da participação política de mulheres (Lei 9.096/1995 e Lei 12.034/2009).
"As candidaturas fictícias de mulheres, que podem ser involuntárias (quando a mulher sequer sabe que faz parte de uma lista do partido) ou voluntárias (estimulada de várias maneiras, inclusive para recebimento de verba pública ou para fins de recebimento de licença remunerada), são uma manifestação de violência política de gênero, pois prejudicam o exercício de direitos políticos", diz. Para enfrentar a questão, a especialista defende, entre outros pontos, a reserva de vagas nas cadeiras representativas — e não apenas das candidaturas.
Representatividade não fictícia O Brasil está entre os países com menor representação feminina na política, ocupando a 142ª posição entre 191 nações citadas no mapa global de mulheres na política da Organização das Nações Unidas (ONU). Mesmo sendo maioria (53%) entre os 150 milhões de eleitores, elas são minoria nos cargos representativos e nas eleições proporcionais para as Casas Legislativas (Câmara, Senado, Assembleias estaduais e Câmaras Municipais).
O analista judiciário do Tribunal Superior Eleitoral (TSE) Alfredo Renan Dimas e Oliveira pontuou que a grande maioria dos municípios brasileiros não chega a ter sequer 10 mil habitantes e que a política de fomento à participação feminina é muito ruim nesses municípios. "Se, de um lado, o partido é obrigado a encontrar essas candidaturas femininas sérias, como fazer isso no contexto social desses pequenos municípios?", questionou.
Para ele, a legislação brasileira deve trocar a penalização dos partidos por incentivo. Uma das sugestões dele é a destinação de um percentual relevante do fundo partidário para incentivar os partidos que alcancem a eleição de representantes femininas.
Impactos da pandemiaOutra pesquisa apresentada no seminário, também com base em dados do estado do Ceará, analisou as filiações entre 2016 e 2020, primeiro ano da pandemia do Covid-19. O estudo "Organização partidária em tempos de pandemia: estratégias partidárias e eleições municipais", trazida pela servidora do Tribunal Regional Eleitoral (TRE/Ceará) Adriana Soares Alcântara, levantou os impactos que a pandemia trouxe na organização partidária nas eleições de 2020.
Durante o período, em que o atendimento presencial foi suspenso nos cartórios e na sede do tribunal, houve implementação do Processo Judicial Eletrônico (PJe) nas Zonas Eleitorais, processo de filiação e desfiliação por e-mail e suspensão de cancelamento dos títulos, formando um cenário conturbado, na avaliação de Adriana, que também compõe a Comissão de Participação Feminina do TRE-CE.
Pesquisas EmpíricasOs Seminários de Pesquisa Empíricas aplicadas a Políticas Judiciárias têm o objetivo de divulgar e debater metodologias, estratégias e resultados alcançados por meio de pesquisas desenvolvidas pelo CNJ e outros órgãos ou entidades com produção acadêmica relacionada à Justiça. As edições apresentam pesquisas e discussões de interesse do Poder Judiciário e promovem a troca de experiências entre interessados e interessadas em produção de pesquisas empíricas e metodologias de geração de dados. Em 2021, foram 13 edições realizadas quinzenalmente.
Com informações da assessoria de imprensa do Conselho Nacional de Justiça.Fonte: Conjur