PL quer revogar honorários de sucumbência na Justiça do Trabalho
No mês passado, foi apresentado na Câmara dos Deputados o Projeto de Lei nº 409/2021, que sugere o fim da exigência de honorários sucumbenciais em processos trabalhistas. O texto altera a polêmica norma implantada na reforma trabalhista de 2017.
A autoria do PL é do deputado Carlos Bezerra (MDB-MT). Para ele, a nova regra se tornou um obstáculo para os trabalhadores que recorrem ao Judiciário contra seus empregadores, pois nem mesmo os beneficiários da Justiça gratuita estão isentos do pagamento desses honorários.
Segundo o parlamentar, o funcionário que aciona a Justiça do Trabalho corre sérios riscos de sair devedor mesmo que consiga provar parte dos fatos, já que pode ser condenado a pagar honorários sucumbenciais sobre aquilo que não comprovou: "Impôs-se aos trabalhadores um verdadeiro temor quanto ao ajuizamento de uma ação", diz ele na justificação do PL.
A proposta revoga o artigo 790-A da Consolidação das Leis de Trabalho (CLT), incluído pela reforma, que estipula o pagamento de honorários de sucumbência de 5% a 15% sobre o valor de liquidação da sentença, o proveito econômico obtido ou o valor atualizado da causa
Além disso, o PL restaura a redação anterior do artigo 790-B, para impedir que beneficiários da Justiça gratuita paguem honorários periciais; e do artigo 840, para retirar a especificação de que o pedido da reclamação seja certo, determinado e com indicação do seu valor.
Projeto enfrenta resistênciaDe acordo com o advogado
Willer Tomaz, sócio do escritório Willer Tomaz Advogados Associados, o PL deve sofrer forte oposição no Congresso Nacional, por militar contra o espírito da reforma trabalhista.
Tomaz acredita que a reforma trouxe diversos ganhos para a sociedade e a Justiça do Trabalho, ao permitir a redução de "causas aventureiras e pedidos esdrúxulos". Porém, admite a falha na possibilidade de exigência dos honorários quando a parte perdedora possuir créditos de outras ações trabalhistas, mesmo se beneficiária da Justiça gratuita:
"A reforma pecou porque o mero recebimento de créditos trabalhistas em outros processos não deveria ser suficiente, por si só, para permitir a cobrança de custas e honorários da parte perdedora, sendo imprescindível a demonstração de que tais créditos são capazes de arcar com o ônus sem prejuízo da subsistência do trabalhador e da sua família, muitas vezes desempregado, inclusive", ressalta.
Mesmo assim, o advogado considera que o projeto de lei é radical, pois protege uma verba alimentar mas elimina outra: "O correto seria uma melhor especificação das condições para a cobrança, como a sua limitação a, no máximo, 30% dos créditos a serem recebidos pelo trabalhador, e como a necessidade de demonstração da capacidade financeira da parte, evitando-se que a cobrança surta efeitos de confisco com violação à dignidade da pessoa", opina.
Pedro Maciel, advogado trabalhista e sócio do escritório Advocacia Maciel, também é favorável à regra da reforma, por desencorajar uma cultura de "pedir tudo e ver no que dá". Segundo ele, ainda há um costume de acionar a Justiça do Trabalho pedindo muito mais do que se tem direito.
Para Maciel, essa cultura continuaria ainda mais forte sem a sucumbência: "Atualmente, em que pese haver a previsão legal de honorários sucumbenciais para a parte trabalhadora, na prática, é muito difícil que esta acabe pagando, tendo em vista que na maioria das vezes o processo fica suspenso até que a empresa no caso comprove que a parte trabalhadora não estaria mais em condições miserabilidade, o que é algo muito difícil a ser feito".
Opositores da reforma veem limitaçõesO projeto não parece conquistar nem mesmo aqueles que também contestam a reforma trabalhista.
Ricardo Calcini, professor de Direito do Trabalho da pós-graduação do Centro Universitário das Faculdades Metropolitanas Unidas (FMU), acredita que uma eventual sanção presidencial da proposta, necessária para que ela se torne lei ordinária, dificilmente aconteceria no atual cenário político. O presidente Jair Bolsonaro votou a favor da reforma em 2017, quando era deputado, e tem interesse em ampliá-la.
Segundo Calcini, a cobrança dos honorários sucumbenciais pode ser revogada daqui dois anos, caso seja eleito um governo de esquerda, contrário à reforma. A alteração poderia ser feita até mesmo com a simples edição de uma medida provisória, que deveria ser ratificada pelo Congresso.
Até lá, a saída mais viável, na visão do professor, seria a conclusão do julgamento do Supremo Tribunal Federal sobre a Ação Direta de Inconstitucionalidade 5.766, que questiona a regra. A pauta foi suspensa em 2018 após pedido de vista do ministro Luís Roberto Barroso. Para Calcini, o STF "poderá colocar em pauta o julgamento dessa importantíssima ADI e dar um ponto final sobre a exigibilidade da cobrança dos honorários advocatícios nas ações trabalhistas".
O advogado e juiz do Trabalho aposentado
José Roberto Dantas Oliva é favorável à restauração da redação do artigo 790-B. Porém, considera desnecessária a modificação do artigo 840, por entender que os advogados, em geral, já se acostumaram a apresentar pedidos certos, determinados e com indicação de valor.
"Hoje há, inclusive, o PJe-Calc Cidadão, programa de cálculos da Justiça do Trabalho que facilitou a apresentação de pedidos líquidos. Em razão disso, muitos juízes já proferem também sentenças líquidas, o que abrevia consideravelmente o tempo de duração de um processo trabalhista, sendo que a alteração pode representar retrocesso", destaca Oliva. Para ele, uma solução seria não exigir a apresentação de pedidos líquidos de quem não esteja assistido por advogado.
Mesmo concordando que o PL afasta o temor dos trabalhadores, José Oliva acredita que sua aprovação beneficiaria mais o próprio empregador, que deixaria de pagar honorários advocatícios em quaisquer hipóteses nas causas trabalhistas: "A mudança proposta premia também, e em proporção maior, os maus empregadores".
Para o advogado, o trabalhador poderia ser mais beneficiado com uma alteração no parágrafo 4º do artigo 791-A, para impedir que quaisquer créditos, mesmo de outros processos, sejam atingidos para satisfazer a condenação em honorários de sucumbência.
Oliva também aponta omissões do projeto de lei: "A reforma trabalhista impôs ao trabalhador, mesmo beneficiário da justiça gratuita, o recolhimento de custas em caso de extinção e arquivamento do processo caso não compareça à primeira audiência, como pressuposto para o ajuizamento de nova ação. Isso é inconstitucional, pois viola o acesso à Justiça. Rigor inaceitável com os mais carentes, e que não está contemplado no PL".
Fonte: ConJur