SAC e o dever de atender com eficiência: impressões sobre o Decreto 11.034

No último dia 5 foi promulgado o Decreto 11.034 pelo presidente da República. O ato normativo foi publicado em 6 de abril do mesmo ano e entrará em vigor 180 dias após sua publicação. Objetiva regulamentar o Código de Defesa do Consumidor por meio do estabelecimento de diretrizes sobre o Serviço de Atendimento ao Consumidor, o conhecido SAC. No primeiro artigo da norma observa-se o destaque ao direito à informação e ao direito de ter suas demandas atendidas, dois grandes pilares da proteção do consumidor.

O correto fornecimento da informação por meio do perfeito cumprimento do dever de informar em todas as fases da relação — inclusive no momento pós-contratual e no atendimento integral — tem o propósito de auxiliar o alcance da equidade informacional e reduzir a vulnerabilidade do consumidor diante do desconhecimento sobre o funcionamento e as características dos produtos e dos serviços.

Além de se configurar como um dever, a informação é direito básico do consumidor, atua como garantidora de seu direito de escolha e o protege contra danos eventualmente suportados em virtude da ausência ou deficiência da informação. O fornecedor tem a obrigação de dar forma àquilo que em função de sua posição no mercado sabe que o consumidor deve conhecer. O serviço de atendimento ao consumidor serve justamente à concretização desse dever, ao esclarecimento e ao aconselhamento para a solução de controvérsias contratuais, adequação dos serviços à legitima expectativa dos consumidores e parâmetros legais e solução de problemas relatados pelos usuários.

O artigo 2ª do recém-publicado decreto qualifica o SAC como serviço de atendimento realizado por diversos canais integrados dos fornecedores de serviços regulados, diferente da disposição, agora revogada, do decreto anterior — o 6.523/08 — que considerava apenas o atendimento telefônico. Trata-se de atualização relevante, tendo em vista a notória ampliação de possibilidades de atendimento ao consumidor pelos mais variados meios digitais, como telefone, aplicativos de chat, envio de mensagens de voz, utilização de redes sociais, aplicativos e sites de comunicação, o antigo SMS e a utilização da inteligência artificial como aliada. Não raras vezes conversamos com máquinas para tirar dúvidas, reclamar, pedir contestação, suspensão ou cancelamento de contratos e de serviços. Essas demandas deverão ser atendidas sem ônus para o consumidor — disposição já prevista no decreto anterior. O atendimento via telefone, entretanto, segue obrigatório, sendo possível que o fornecedor coloque à disposição pelo menos um dos canais de atendimento de forma ininterrupta, durante vinte e quatro horas por dia, sete dias por semana.

A veiculação de mensagens publicitárias durante a espera para o atendimento segue proibida, mas poderão ser divulgadas mensagens informativas, desde que tratem dos direitos e deveres dos consumidores ou dos outros canais de atendimento disponíveis. Não poderá haver condicionamento do acesso inicial ao atendente ao fornecimento prévio de dados pelo consumidor e continua obrigatória a acessibilidade em canais do SAC para as pessoas com deficiência. Ressalta-se que esse atendimento específico não necessariamente precisa ocorrer por chamada telefônica, sendo suficiente a preservação do acesso pleno para solução das demandas dos consumidores com necessidades específicas.

O artigo 5º do Decreto 11.034/22 dispõe sobre as condições mínimas para o atendimento telefônico do consumidor a serem consideradas pelos órgãos ou entidades reguladoras competentes. Essas disposições ficaram conhecidas como "humanização do SAC" em razão da previsão de horário de atendimento não inferior a oito horas diárias, como disponibilização de atendimento por humano e necessidade de contato direto com o atendente, se essa opção for selecionada pelo consumidor. As opções de reclamação e cancelamentos são consideradas essenciais e devem constar no primeiro menu e há necessidade de transferência ao setor competente para atendimento definitivo da demanda quando o atendente inicial não tiver essa atribuição.

Para o contato direto com um ser humano e para a resolução por alguém que efetivamente possa solucionar a questão, o estado deve estipular um tempo máximo de espera. Além disso, há previsão de que o horário de atendimento telefônico por humano seja superior ao mínimo de oito horas, cabendo a decisão aos órgãos reguladores.

A utilização da inteligência artificial no serviço de atendimento aos consumidores permite a redução de custos e a maior eficiência na padronização de procedimentos, mas há circunstâncias que exigem conduta humana ou solução não passível de resposta padronizada. A cultura da virtualidade real associada a um sistema multimídia eletronicamente integrado contribui para a transformação do tempo e a comunicação mediada por computadores possibilita o diálogo em tempo real em nossa sociedade. De forma geral, pode-se dizer que a tecnologia contribui para o funcionamento de muitos sistemas e possibilita contratações entre consumidor e fornecedor. Esse contato, todavia, deve ser mantido e não afastado pelas ferramentas digitais. É importante que o fornecedor verifique em quais casos e de que forma a atenção ao consumidor deve ser feita por um ser humano ou em que situações a máquina deve ser mais calibrada e o sistema alimentado ou projetado para que o atendimento seja útil, direto e gentil. Também se salienta a dificuldade de alguns grupos de consumidores, considerados hipervulneráveis por várias razões e que podem ter dificuldades com o atendimento digital, exigindo maior orientação e difusão das possibilidades de atendimento pelas empresas.

Além da divulgação das opções de acesso ao SAC em todos os documentos e materiais impressos entregues ao consumidor, as formas de contato devem ser divulgadas de maneira clara também em todos os canais eletrônicos. No capítulo do decreto que versa sobre a qualidade do tratamento das demandas, os princípios da dignidade, boa-fé, transparência, eficiência, eficácia, celeridade e cordialidade permanecem como na norma anterior. A novidade é a necessidade de garantia de tempestividade, segurança, privacidade e resolutividade da demanda.

São disposições que se alinham aos princípios do sistema protetivo do consumidor e ao cumprimento de normas de proteção de dados pessoais e valorização do tempo do consumidor, temas corriqueiros e importantes na conhecida sociedade de consumo, cada vez mais digital, rápida em alguns aspectos, lentas em outros.

A imposição de agilidade ao atendimento do consumidor já existia no decreto anterior e é observada em leis municipais que restringem cronologicamente o tempo de espera em filas de bancos, por exemplo. A noção de tempo pode ser analisada em razão do fenômeno temporal, cultural ou em razão da pessoa, mas seja como for, o tempo não pode ser ignorado pelo Direito. Muitas vezes os consumidores desistem de reivindicar direitos resultantes de problemas de contratação em face dos obstáculos existentes para contatar os fornecedores. Práticas que menosprezam o tempo do consumidor não devem ser toleradas.

O dever de atuação com agilidade e eficiência torna o tempo uma prestação indireta. O atendimento ao consumidor deve ser atividade pautada no cumprimento aos seus deveres básicos, de conhecida origem constitucional, e às expectativas de celeridade, qualidade e gentileza no atendimento. Quem tem um problema a resolver espera boa vontade, cortesia, educação e agilidade, atributos que compõem a qualidade do atendimento.

Em consonância com a Lei Geral de Proteção de Dados, o Decreto dispõe sobre a necessidade de sua observância, preocupação existente na norma anterior, no entanto, sem menção à lei 13.709/18. A vedação à solicitação da repetição da demanda do consumidor após o registro no primeiro atendimento é ratificada no novo decreto. A intenção é poupar o consumidor de perder tempo e ter de repetir inúmeras vezes os mesmos fatos.

Caso a chamada seja finalizada pelo fornecedor antes da conclusão do atendimento, deve haver o retorno ao consumidor com a comunicação do número de registro do atendimento e a conclusão da solicitação.

O direito do consumidor ao acompanhamento das demandas segue mantido e deve ser garantido nos diversos canais de atendimento, por meio de registro numérico ou outro tipo de procedimento eletrônico. O histórico de atendimento ao consumidor será enviado por correspondência ou por meio eletrônico (e-mail ou qualquer outra forma útil) e conterá todas as informações relacionadas à demanda. No caso de chamada telefônica, permanece o dever de manutenção da gravação pelo prazo mínimo de noventa dias. O consumidor poderá requerer acesso ao conteúdo da chamada, mas não há mais previsão do prazo máximo de 72 horas para atendimento a essa solicitação específica.

As demandas do consumidor deverão ser respondidas no prazo de sete dias corridos e a resposta do fornecedor deverá ser clara, objetiva e conclusiva, abordando todos os pontos solicitados. Se o requerimento versar sobre serviço não solicitado ou cobrança indevida, permanece o dever de adoção de medidas imediatas pelo fornecedor.

A novidade quanto ao processamento de pedido de cancelamento é o afastamento dos efeitos imediatos do pedido do consumidor caso seja necessário processamento técnico da demanda, situação em que o prazo para conclusão será fixado pelos órgãos reguladores. O cancelamento programado é uma nova opção a ser oferecida para o consumidor, mas é sujeito à sua anuência. Assevera-se que a anuência deve ser efetiva, após o esclarecimento de todas as condições. O direito a ser informado por ocasião de cancelamento de serviço é valorizado pelo decreto, com a disposição do dever de informar sobre eventuais condições aplicáveis à rescisão e as multas incidentes por descumprimento de cláusulas contratuais de permanência mínima – a conhecida fidelidade.

A efetividade do serviço de atendimento ao consumidor será acompanhada pela Secretaria Nacional do Consumidor do Ministério da Justiça e Segurança Pública, que ouvirá órgãos e entidades reguladoras, integrantes do Sistema Nacional do Consumidor e representantes de prestadores de serviços de relacionamento com consumidores. Parâmetros como quantidade de reclamações, taxa de resolução de demandas (sob a ótica do consumidor!), índice de reclamações e grau de satisfação do consumidor devem ser considerados.

Para que o requisito da transparência seja cumprido, os resultados da implementação da ferramenta de acompanhamento da efetividade do SAC devem ser divulgados no mínimo uma vez ao ano. Caso haja conclusão de pouca efetividade no atendimento, após análise dos dados com a utilização das ferramentas específicas, pode ser utilizado o recurso de aumento de oito horas diárias de atendimento por humanos.

O atendimento humanizado não é somente aquele feito por humanos, mas para humanos. A efetiva comunicação e o atendimento às solicitações do consumidor devem ser realizados em um contexto de gentileza e respeito, proporcionando-se um tratamento empático, educado e que considere as peculiaridades do indivíduo que precisa resolver um problema. Os consumidores e os atendentes devem ser tratados como sujeitos de obrigações e de direitos. O que todos esperamos é que a busca por soluções via SAC deixe de ser um incômodo como muitas vezes é.

Fonte: Conjur

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