Ministros do STF decidiram nesta quarta-feira, 26, que 40g de cannabis ou seis plantas-fêmeas distinguirão o porte de maconha para uso do porte para tráfico, até que nova legislação seja estabelecida.
A Corte chegou a um consenso de que essa quantidade seria ideal, baseando-se na legislação do Uruguai, que utiliza 40g como parâmetro.
Além disso, a maioria da Corte considerou que o uso de maconha é um ilícito administrativo, não penal, tratando-se de uma questão de saúde pública. Dessa forma, na prática, não haverá consequências criminais, apenas administrativas.
No início da sessão, ministro Luís Roberto Barroso explicou que cabe ao STF julgar a descriminalização e definir critérios que separem uso do tráfico porque é no Supremo que chegam HCs questionando a manutenção de prisões por envolvimento com drogas.
Decisão
Quanto ao dispositivo, por maioria, a Corte deu provimento ao RE na parte referente à absolvição do acusado. Vencidos os ministros Luiz Fux, André Mendonça, Nunes Marques e Dias Toffoli.
Ademais, votaram por conferir interpretação conforme à CF ao art. 28 da lei 11.343/06 (lei de drogas), de modo a afastar do referido dispositivo, todo e qualquer efeito de natureza penal, mantidas no que couber, até o advento de legislação específica, as medidas ali previstas.
Votaram nesse sentido, ministros Gilmar Mendes, Luís Roberto Barroso, Edson Fachin, Alexandre de Moraes e ministras Rosa Weber (atualmente aposentada) e Cármen Lúcia. Ficaram vencidos ministros Cristiano Zanin, Nunes Marques, André Mendonça, Dias Toffoli e Luiz Fux.
Tese
A seguinte tese foi enunciada no plenário:
"1. Não comete infração penal quem adquirir, guardar, transportar ou trouxer consigo para consumo pessoal a substância cannabis sativa, sem prejuízo do reconhecimento da ilicitude extrapenal da conduta, com apreensão da droga e aplicação das sanções de advertência sobre os efeitos dela (art. 28, I da lei 11.343/06) e medida educativa de comparecimento a programa ou curso educativo (art. 28, III, da lei 11.343/06).
2. As sanções estabelecidas nos incisos I e III do art. 28 da lei 11.343/06 serão aplicadas pelo juiz em procedimento de natureza não penal, sem nenhuma repercussão criminal para a conduta.
3. Em se tratando de posse de cannabis para consumo pessoal, a autoridade policial apreenderá a substância e notificará o autor do fato para comparecer em juízo, sendo vedada a lavratura de auto de prisão em flagrante ou de termo circunstanciado.
4. Nos termos do §2º do art. 28 da lei 11.343/06 será presumido usuário quem, para uso próprio, adquirir, guardar, tiver em depósito, transportar ou trouxer consigo até 40g de cannabis sativa, ou 6 plantas-fêmeas, até que o Congresso legisle a respeito.
5. A presunção do item anterior é relativa, não estando a autoridade policial e seus agentes impedidos de realizar a prisão em flagrante por tráfico de drogas mesmo para quantidades inferiores ao limite acima estabelecido quando presentes elementos indicativos do intuito de mercancia, como a forma de acondicionamento da droga, as circunstâncias da apreensão, a variedade de substâncias apreendidas, a apreensão simultânea de instrumentos como balança, registros de operações comerciais e aparelho celular contendo contatos de usuários ou traficantes.
6. Nestes casos, caberá ao delegado de polícia, consignar no auto de prisão em flagrante, justificativas minudentes para o afastamento da presunção do porte para uso pessoal, sendo vedada a alusão a critérios subjetivos e arbitrários.
7. Na hipótese de prisão por critérios superiores ao item 4, deverá o juiz na audiência de custódia avaliar as razões invocadas para o afastamento da presunção de porte para uso próprio.
8. A apreensão de quantidade superiores aos limites ora fixados não impede o juiz de concluir pela atipicidade da conduta, apontando nos autos prova suficiente da condição de usuário.
O Supremo deliberou ainda nos termos do voto do relator determinar ao CNJ em articulação com o ministério da Saúde, ANVISA, ministério da Jusdtiça e Segurança Pública, tribunais e CNMP a adoção de medidas para permitir o cumprimento da presente decisão pelos juízes, com aplicação das sanções previstas no art. 28, I e III, em procedimento não penal.
Criação de protocolo próprio para audiências de usuários e dependentes com encaminhamento do indivíduo vulnerável aos órgãos da rede pública de saúde capacitados a avaliar a gravidade da situação e oferecer tratamento especializado, como centros de atenção psicossocial de álcool e drogas
Até que seja fixado pelo CNJ esse novo rito, a competência para julgar as condutas do art. 28 da lei de drogas será excepcionalmente dos juizados especiais criminais, conforme a sistemática atual, vedada a atribuição de quaisquer efeitos penais para a sentença.
Fazer apelo aos Poderes Executivo e Legislativo para adotarem medidas administrativas e legislativas para aprimorar as políticas públicas de tratamento ao dependente, deslocando o enfoque da atuação estatal do regime puramente repressivo para um modelo multidisciplinar que reconheça a interdependência das atividades de prevenção ao uso de drogas, atenção especializada e reinserção social de dependentes e repressão da produção não autorizada e do tráfico de drogas.
Conclamar os Poderes a avançarem no tema, estabelecendo uma política focada:
Na não estigmatização, mas no engajamento dos usuários, especialmente os dependentes, em um processo de autocuidado contínuo que lhes possibilite compreender os graves danos causados pelo uso de drogas.
Na agenda de prevenção educativa, implementando programas de dissuasão ao consumo de drogas.
Na criação de órgãos técnicos na estrutura do Executivo compostos por especialistas em saúde pública com atribuição de aplicar aos usuários e dependentes as medidas previstas em lei.
Para viabilizar a concretização dessa política pública, especialmente a implementação de programas de dissuasão contra o consumo de drogas e a criação de órgãos especializados no atendimento aos usuários, caberá aos Poderes Executivo e Legislativo assegurar dotações orçamentárias suficientes para essa finalidade. Para isso a União deverá liberar o saldo acumulado do fundo Nacional Antidrogas (FUNAD), instituído pela lei 7.560/86 e gerido pelo ministério da Justiça e Segurança Pública e se abster de contingenciar recursos que deverão ser utilizados, inclusive, para programas de esclarecimento sobre os malefícios do uso de drogas e os futuros aportes no fundo.
O CNJ realizará mutirões carcerários para apurar e corrigir prisões decretadas em desacordo com os parâmetros fixados neste voto, com a participação das Defensorias Públicas.
O caso
O Supremo analisou a constitucionalidade do art. 28 da lei de drogas (lei 11.343/06), que estabeleceu a figura do usuário, diferenciando-o do traficante, sujeito a penalidades mais severas. A fim de distinguir usuários e traficantes, a legislação prevê penas alternativas para aqueles que adquirirem, transportarem ou portarem drogas para consumo próprio, como prestação de serviços à comunidade, advertência sobre os efeitos das drogas e participação obrigatória em curso educativo.
Embora a lei tenha abolido a pena de prisão para usuários, a criminalização do porte de drogas para consumo pessoal foi mantida. Consequentemente, usuários continuam sujeitos a inquéritos policiais e processos judiciais que visam o cumprimento das penas alternativas.
No processo específico que originou o julgamento, a defesa de réu condenado por porte de drogas solicitava que o porte de maconha para uso próprio deixasse de ser considerado crime. O acusado foi preso portando três gramas de maconha.
Fonte: www.migalhas.com.br
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