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TikTok: Entenda restrições nos EUA e como é regulação em outros países


22/01/2025

No dia 17 de janeiro de 2025, uma decisão da Suprema Corte dos Estados Unidos quase alterou permanentemente a paisagem das redes sociais no país. Foi validada uma nova lei que exigia que o TikTok fosse vendido para uma empresa americana para continuar suas operações, levando o aplicativo a ficar fora do ar por algumas horas. O movimento ocorreu em um contexto de crescentes preocupações com a segurança e privacidade dos dados coletados por aplicativos de propriedade estrangeira.

Mas a situação tomou outro rumo quando, ao tomar posse no dia 20, Donald Trump revogou a lei. Trump editou um decreto que não apenas eliminou a proibição, mas também estabeleceu um prazo de 75 dias para que seu governo esboçasse uma política mais definitiva sobre o funcionamento de empresas estrangeiras de internet nos Estados Unidos.

Para entender melhor as regras envolvendo o funcionamento de empresas estrangeiras no Brasil, entrevistamos Ricardo Campos, professor assistente na Goethe Universität Frankfurt am Main, Alemanha, e especialista em Direito Digital.

Regulação de empresas estrangeiras no Brasil

O professor Ricardo Campos explica que o Brasil não exige que as empresas que desenvolvem ou administram aplicativos estejam sob o controle de empresas ou cidadãos brasileiros, pois promove a livre iniciativa, a liberdade econômica e a livre concorrência, asseguradas pela CF (art. 1º, IV e 170, IV).

Mas um fator é importante: empresas que desejam operar no Brasil respondem às leis nacionais.

Neste caso, Campos indica a observância da lei das sociedades por ações e a legislação específica que regula o registro e a atuação de empresas estrangeiras, como a lei 8.934/94, além de obterem registro perante a Junta Comercial e número de inscrição no CNPJ.

"De maneira geral, todas as empresas estrangeiras que oferecem produtos e serviços para a população brasileira devem observar a legislação nacional. Para aquelas que atuam na internet, o destaque é a observância ao Marco Civil da Internet, o Código de Defesa do Consumidor e a Lei Geral de Proteção de Dados."

Veja dispositivos do Código Civil relacionados ao tema, que tratam de domicílio e nomeação de representante no Brasil:

Art. 75. Quanto às pessoas jurídicas, o domicílio é:

§ 2 o Se a administração, ou diretoria, tiver a sede no estrangeiro, haver-se-á por domicílio da pessoa jurídica, no tocante às obrigações contraídas por cada uma das suas agências, o lugar do estabelecimento, sito no Brasil, a que ela corresponder.

Da Sociedade Estrangeira

Art. 1.134. A sociedade estrangeira, qualquer que seja o seu objeto, não pode, sem autorização do Poder Executivo, funcionar no País, ainda que por estabelecimentos subordinados, podendo, todavia, ressalvados os casos expressos em lei, ser acionista de sociedade anônima brasileira.

§ 1 o Ao requerimento de autorização devem juntar-se:

V - prova de nomeação do representante no Brasil, com poderes expressos para aceitar as condições exigidas para a autorização;

Já o Marco Civil da Internet dispõe que:

Art. 11. Em qualquer operação de coleta, armazenamento, guarda e tratamento de registros, de dados pessoais ou de comunicações por provedores de conexão e de aplicações de internet em que pelo menos um desses atos ocorra em território nacional, deverão ser obrigatoriamente respeitados a legislação brasileira e os direitos à privacidade, à proteção dos dados pessoais e ao sigilo das comunicações privadas e dos registros.

Já o art. 21 prevê que o provedor de internet será responsabilizado subsidiáriamente por violações decorrentes de divulgação de conteúdo - e, em se tratando de empresa estrangeira, responde solidariamente sua filial situada no país.

Regras nos Estados Unidos

Nos Estados Unidos, afirma Ricardo Campos, as preocupações com a segurança nacional em relação ao TikTok remontam a 2020. "O governo norte-americano, sob a administração de Donald Trump, utilizou uma lei chamada International Emergency Economic Powers Act (IEEPA), que confere ao presidente poderes amplos para regular transações comerciais envolvendo entidades estrangeiras em situações de emergência nacional. Nesse contexto, o presidente emitiu uma ordem executiva proibindo transações com a ByteDance, controladora do TikTok, alegando riscos de que os dados de usuários norte-americanos pudessem ser acessados pelo governo chinês."

Adicionalmente, explica o especialista, o Comitê de Investimentos Estrangeiros nos Estados Unidos (CFIUS), um órgão Federal que avalia riscos à segurança nacional provenientes de investimentos estrangeiros, também desempenhou um papel importante. O CFIUS recomendou que a ByteDance se desfaça de suas operações nos EUA como forma de mitigar riscos de segurança. No entanto, essas tentativas enfrentaram vários desafios legais, e os tribunais bloquearam as proibições com base em argumentos de liberdade de expressão e falta de justificativas suficientes. "Essa controvérsia demonstrou os limites do IEEPA e a necessidade de uma legislação mais específica."

Diante das dificuldades enfrentadas no cenário jurídico anterior, o Congresso norte-americano aprovou o Protecting Americans from Foreign Adversary Controlled Applications Act (PAFACAA), lei cuja constitucionalidade fora recentemente confirmada pela Suprema Corte dos Estados Unidos, mas cuja entrada em vigor foi agora prorrogada por Trump.

O projeto de lei foi proposto em janeiro de 2024, aprovado por ampla maioria na Câmara dos Representantes, e sancionado pelo então presidente Joe Biden, em abril do mesmo ano. O projeto buscava preencher lacunas legais identificadas durante as tentativas anteriores de restringir o TikTok, oferecendo uma base legal clara e específica para abordar ameaças associadas a aplicativos controlados por adversários estrangeiros, como a ByteDance, controladora do TikTok.

Entre seus pontos principais, o PAFACAA proíbe empresas americanas de oferecer serviços de distribuição, manutenção ou atualização de aplicativos sob controle de adversários estrangeiros, a menos que suas operações nos Estados Unidos sejam desvinculadas de tal controle. O principal objetivo declarado é proteger os dados sensíveis de cidadãos norte-americanos, especialmente diante de leis chinesas que obrigam empresas locais a cooperarem com operações de inteligência do governo.

Proibição da rede na Euro

O especialista avalia que uma proibição do TikTok na Europa, embora teoricamente possível, é altamente improvável no cenário atual. A UE - União Europeia tem preferido uma abordagem regulatória, em vez de adotar uma proibição total, como ocorreu em países como os Estados Unidos. Essa posição pode ser explicada por diversos fatores.

Primeiramente, a UE implementou legislações abrangentes, como a Lei de Serviços Digitais (Digital Services Act, ou DSA), que obriga as plataformas a combater conteúdos ilegais e mitigar práticas prejudiciais. O DSA permite ações específicas, como a suspensão temporária de funcionalidades ou até de plataformas inteiras em casos de descumprimento de determinadas normas. No entanto, essas medidas são voltadas para o comportamento das plataformas, e não para questões de segurança nacional, que constituem a principal justificativa dos Estados Unidos para restringir o TikTok.

Além disso, a segurança nacional continua sendo uma prerrogativa dos Estados-membros da UE. Embora alguns países, como Bélgica e Irlanda, tenham proibido o uso do TikTok em dispositivos governamentais, uma proibição em todo o bloco exigiria consenso - algo difícil de alcançar, considerando as diferentes prioridades nacionais e contextos políticos.

De acordo com o professor, a relação da UE com a China acrescenta outra camada de complexidade. Essa relação é marcada tanto por cooperação quanto por rivalidade estratégica.

"Embora existam preocupações quanto à segurança dos dados do TikTok e possíveis vínculos com o governo chinês, uma proibição generalizada poderia ter implicações geopolíticas mais amplas, potencialmente impactando o comércio e as relações diplomáticas com Pequim."

Além disso, críticos argumentam que problemas como violações de privacidade de dados e designs que incentivam comportamentos compulsivos não são exclusivos do TikTok.

Plataformas da Meta, como Facebook e Instagram, enfrentam acusações semelhantes, o que tornaria uma proibição direcionada ao TikTok incoerente, diz Ricardo Campos. "Além disso, o TikTok é uma ferramenta política valiosa para muitos líderes da UE, que o utilizam para engajar audiências mais jovens."

O chanceler alemão Olaf Scholz e o presidente francês Emmanuel Macron, por exemplo, possuem uma presença significativa na plataforma. Essa utilidade como canal de comunicação reduz a probabilidade de uma proibição total. Por fim, a UE já adotou medidas para reduzir a influência do TikTok, como exigir alterações em funcionalidades que poderiam incentivar comportamentos compulsivos. "Essas ações demonstram a preferência da UE por intervenções graduais e baseadas em regras, em vez de medidas radicais."

Outros países

Em relação a outros países, alguns implementaram proibições ou restrições ao TikTok por diferentes motivos, que variam de preocupações com segurança nacional a questões domésticas.

Países como Austrália, Reino Unido, Canadá e algumas instituições da UE proibiram o TikTok em dispositivos governamentais, citando riscos cibernéticos e a possibilidade de exposição de dados sensíveis. Outros países focaram em preocupações sociais; por exemplo, a Albânia justificou sua proibição de um ano pelo aumento da violência juvenil e do bullying associado à plataforma. Na Índia, uma proibição permanente do TikTok e de outros aplicativos chineses foi imposta após um conflito fronteiriço com a China, evidenciando tensões geopolíticas. Já o Afeganistão baniu o aplicativo por razões morais, enquanto o Paquistão impôs repetidas proibições temporárias, alegando preocupações com "conteúdo imoral".

"Essas proibições refletem uma combinação de dinâmicas globais que envolvem segurança, política e questões sociais relacionadas ao TikTok."

Responsabilização

Para o especialista, o banimento do TikTok nos Estados Unidos é, antes de tudo, uma medida de caráter populista que, apesar de justificar-se sob o argumento de segurança nacional, pode ter consequências econômicas e sociais prejudiciais.

"As plataformas digitais desempenham hoje um papel central não apenas na economia global, mas também na governança e na comunicação pública, sendo ferramentas indispensáveis para empresas, governos e cidadãos. Medidas extremas como um banimento ignoram a complexidade desse ecossistema e podem gerar rupturas desnecessárias, afetando negativamente o ambiente de negócios e o fluxo de inovação."

No entanto, para o professor, é inegável que as plataformas digitais precisam ser mais responsabilizadas, especialmente em questões como a disseminação de desinformação, violações de privacidade e práticas que incentivam comportamentos prejudiciais. "Para isso, é fundamental que elas respeitem as legislações nacionais e se submetam a regulações que promovam transparência e responsabilidade, sem abrir mão de princípios democráticos."

Ricardo Campos conclui pontuando que o debate em torno do TikTok não deve ser reduzido a uma rivalidade geopolítica entre Estados Unidos e China, mas ampliado para abordar os desafios globais impostos pelas plataformas digitais. "Isso exige um esforço coletivo para construir marcos regulatórios equilibrados, que reconheçam tanto os benefícios econômicos e sociais dessas tecnologias quanto a necessidade de proteger os direitos e interesses dos cidadãos".

"Proibir uma plataforma isolada pode até gerar manchetes, mas não resolve os problemas estruturais que permeiam o universo digital."

Fonte:  www.migalhas.com.br

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